domingo, 17 de julho de 2011

Entendendo o Movimento dos Professores da Rede Estadual de Ensino.




Senhores Deputados.

Entendo que a maioria dos senhores, que não são da área da Educação, não têm a obrigação de saberem os pormenores que levaram à deflagração da greve que há mais de um mês atinge as escolas da rede estadual. Só peço aos senhores paciência para lerem as considerações a seguir.
Desde o início do ano letivo de 2011, os representantes da categoria têm tentado apresentar ao Sr. Secretário de Educação, Wilson Risolia, as nossas reinvindicações, mas a estratégia dele foi sempre a de nos ignorar.
Aliás, o desprezo pela nossa categoria tem sido manifestada desde a sua posse, quando declarou que os professores ganhavam bem pelo que trabalhavam. “Maravilhoso” começo de gestão, que deu o “ponta- pé” inicial na relação mais conturbada que já vi entre um secretário da pasta e os professores na história deste nosso Estado do Rio de Janeiro.
Como nunca havia colocado os pés antes numa escola estadual, desconhecia, e ainda desconhece, que cada professor tem em média 240 alunos. Imagine o quanto isso representa de trabalho extraclasse, salientando-se que raríssimas são as escolas estaduais que têm orientadores pedagógicos e educacionais. Somos vítimas, como também ocorre com muitos parlamentares, do trabalho invisível, haja vista que também é muito comum se considerar no caso dos senhores somente a presença no plenário, e não o trabalho nas bases, nas comissões etc.
Neste início de ano letivo a SEEDUC nos brindou com um famigerado Plano de Metas, sem qualquer participação da comunidade escolar, tentando implementar na rede estadual de educação a lógica de produtividade da iniciativa privada. A visão é de se organizar a escola como uma fábrica, os professores como máquinas e os alunos como mercadorias.
Assim, a remuneração dos professores está diretamente atrelada ao alcance das tais metas, reajuste salarial nem pensar. Então, para o professor ter direito a um “14º salário” as metas são as seguintes, fruto da “genialidade” da equipe da SEEDUC: Ótimo desempenho dos alunos na prova padronizada do Saerj (português e matemática), sem qualquer consideração às peculiaridades de cada escola, sendo submetidos a esta prova também os alunos com necessidades especiais, cuja inclusão no ensino regular é garantido por lei, e também os alunos que não tiveram aulas destas matérias por carência de professores; índices de gravidez, envolvimento com drogas, participação dos maiores de 16 anos nas eleições, distorção idade-série (e os alunos especiais ?) e outros absurdos que nada têm a ver com o processo pedagógico, este sim de responsabilidade, dentre outros profissionais, também do professor. Isso sem falar no professor que acometido de alguma doença e cometer o abuso de tirar licença-médica, sofrerá como punição a exclusão da virtual gratificação.
Desde o início do ano letivo temos tido a preocupação de colocar, tanto alunos como seus responsáveis, a par de todos estes pontos da política educacional do Estado. Portanto, não nos surpreende o grande apoio que temos recebido ao nosso movimento, mesmo conscientes do prejuízo momentâneo que estão sofrendo, mas participando conosco de uma luta que tem por objetivo traçar um rumo responsável para a Educação no nosso Estado do Rio de Janeiro para os próximos anos.
O discurso da falta de verbas para reajustar os salários dos professores, não encontra eco entre os responsáveis pelos alunos, que na maioria foram eleitores do Governador Sérgio Cabral, que constatam com os seus próprios olhos, ares-condicionados e computadores alugados por valores unitários maiores do que o salário de um professor, cada porta substituída no valor de R$ 4.000,00, pintura de sala de aula de 35m2 no valor de R$ 6.000,00. Em Nova Friburgo, a reforma da quadra esportiva do maior colégio estadual da cidade custou o preço de uma fazenda, cerca de R$ 800.000,00.
Aliás, citando Nova Friburgo, cidade que mais sofreu com a tragédia da região serrana, temos um índice de 70% de paralisação. Acredito que muito contribuiu para esta adesão a atitude completamente insensível da equipe da SEEDUC na época. Numa reunião com os diretores, os mesmos argumentaram pela necessidade de adiamento do início do ano letivo devido à perda de profissionais e alunos, mortos na tragédia, além de que inúmeras escolas haviam sido atingidas por deslizamentos e pelas águas, tendo suas estruturas afetadas. Isso sem mencionar que o nosso maravilhoso Instituto de Educação de Nova Friburgo, serviu de IML, abrigando mais de 400 corpos. Resposta dos técnicos: não queremos saber de sentimentalismos, o retorno se dará de qualquer jeito no dia 07 de fevereiro. Estas pessoas estão à frente da Educação em nosso Estado.
Não há segredo para uma educação de qualidade: profissionais qualificados e bem remunerados, estrutura e materiais pedagógicos adequados. Computadores são instrumentos a serem utilizados pelo profissional, não o substituem. A fórmula é conhecida, mas será que há interesse real numa educação pública de qualidade? Temo que não, pois quem ira querer pagar escolas particulares e quantos políticos querem o povo educado e crítico da situação do país.
Chegamos a um ponto crítico. Os professores não darão um passo atrás no movimento, mesmo que isso comprometa, inexoravelmente, todo o nosso ano letivo. Basta de colocar a culpa das mazelas nos profissionais que trabalham com salários indignos e são constantemente desrespeitados por “paraquedistas”, que jamais pisaram numa sala de aula da rede pública de ensino. O secretário Risolia distorce, desde o início da sua gestão, todas as estatísticas da SEEDUC. Faz declarações que a categoria sabe que não são verdadeiras, tentando nos incompatibilizar com a população. Chegou ao cúmulo de distorcer uma decisão judicial, fazendo publicar no site da SEEDUC que a justiça nos tinha obrigado a repor as aulas, omitindo a parte dispositiva da decisão que proibiu o corte do nosso ponto e anotações na folha funcional, reconhecendo o nosso direito constitucional de greve.
Hoje, o secretário-economista, se utiliza do Jornal O Dia para mais uma vez, de forma unilateral, sem qualquer diálogo com a categoria, anunciar o aumento da carga-horária dos professores, e não da hora-aula. Aumento de salário acompanhado de aumento de carga-horária significa somente agravar a crise provocada pela super-exploração da mão-de-obra barata em que se converteram os professores da rede estadual de ensino. Neste momento, em que deveria haver desarmamento dos espíritos para chegarmos a um consenso, ele novamente opta em provocar e mesmo afrontar a categoria. Lembremo-nos que ele também utilizou o mesmo meio de comunicação para declarar que estava lendo o livro “A Arte da Guerra” para conhecer melhor os inimigos. Quais ? Os professores.
Finalizando, está nas mãos do Governo do Estado o fim da greve. Já foi reconhecido por membros do governo que há recursos para conceder o aumento pleiteado pelos professores. Condicionar as negociações à suspensão da greve apenas arrastará o movimento por mais tempo, porque nem passa pelas nossas cabeças esta possibilidade, não há relação de confiança para isso. Ora, por que não negociar agora ? Quem recebeu a carta do então candidato Sérgio Cabral, ainda no seu primeiro mandato, é “gato escaldado” e não vai se arriscar na água fria.
Agradeço a paciência, mas os senhores talvez, agora, possam entender melhor a posição dos professores e tentar sensibilizar o governador para o atendimento das nossas reivindicações, porque com os secretários de Educação e Planejamento é muito difícil, pois para eles a vida está resumida a números e estatísticas, que têm o condão de fazer desaparecerem os seres humanos, que se submetem a spray de pimenta nos olhos e a ficarem acampados no meio da rua em condições humilhantes porque acreditam numa causa: EDUCAÇÃO PÚBLICA GRATUITA E DE QUALIDADE PARA A POPULAÇÃO TRABALHADORA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO.

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